1 de nov. de 2012

Implicâncias

Ele sempre implicava com o meu perfume, dizia que era doce demais. Mas quando eu usava outro, ele dizia que preferia o doce. Ele reclamava quando eu usava aqueles shorts curtos, mas quando eu colocava uma calça jeans, ele dizia que preferia o short. E era assim sempre. Ele sempre reclamava e quando eu mudava, ele dizia que preferia o outro. Ele tinha aquele jeito bobo de sorrir e fazer com que eu sorrisse logo em seguida. Tinha também uma mania estranha de ficar me encarando fazendo com que eu ficasse sem saber o que fazer ou o que falar. Aí, ele me abraçava e sorria, e logo eu sorria também. E a gente ficava nesse ciclo vicioso todo o dia. E quando íamos ao parque e os outros olhavam, nós ríamos, mas uma risada alta, com vontade e que, para os outros, até chegava a ser mais engraçada. Seu cabelo bagunçado e aquele cheiro de cigarro me deixavam irritada. Eu pegava o cigarro e o jogava no chão, em seguida bagunçava o seu cabelo mais ainda, na tentativa de deixá-lo melhor. E ele sorria, e eu sorria. E era isso, até que ele tentava contar uma daquelas suas piadas sem-graça, sempre as mesmas e, quando tinha aprendido alguma nova, sempre parava na metade porque esquecia o resto. E eu o encarava, esperando qualquer palavra sua que fosse, ou até mesmo um risinho ridículo que me fazia levantar e fazer com que ele viesse atrás de mim. Teve aquele dia também, que eu saí correndo sem mesmo olhar para trás — porque, no fundo, eu sabia que ele viria atrás de mim — e quando eu parei de correr para esperá-lo, ele reclamou e mandou eu nunca mais sair correndo. Foi aí que eu dei uma risadinha e voltei a correr, sabendo que mesmo reclamando, ele viria atrás de mim, como sempre fez. Lembro também daquele dia no meu apartamento, que eu mudei uma mesinha, daquelas que a gente usa pra jogar revistas e jornais em cima, de lugar. E ele reclamou, e eu coloquei no mesmo lugar de antes. Mas ele disse que gostou do jeito que estava e foi aí que eu joguei um jornal nele. Ele também falava que meu café era forte demais, e justo no dia que eu fiz um pouco mais fraco a minha mãe foi lá em casa e disse que aquilo não era café, e sim água de batata. E os dois se olharam e riram e eu vendo os dois rindo, acabei rindo também. Sem falar no dia que eu troquei as cortinas por umas mais claras, nunca vi ele reclamar tanto. Porque batia sol no rosto dele quando ele sentava na cadeira, porque isso, porque aquilo… Mas o que é que eu posso fazer se fazia um tempinho que eu não lavava as cortinas? Pensei até que eu não ia aguentar aquela reclamação e ia ter que colocar elas sujas mesmo… Mas quer saber? Eu não me importava em trocar e destrocar tudo de novo… Contanto que ele não parasse de reclamar, o resto a gente ajeitava.

(Alessandra Delgobo)

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